gmr

segunda-feira, abril 24, 2006

Retiro

a confusão sempre me trouxe poesia
um dia desses a vida se mostrou na sua aspereza
e eu começei a escrever minhas tripas
pra ver se inventava uma saída

experimento a vida
em doses de pequeno efeito, silabando
e, há tempos, já não posso
já não encontro conforto
na explicitude das palavras

até sonho frases de efeito
entendo alguns motivos dormindo
acordo pensando genialidades
mas que se não escrevo se dispersam

queria eu pintar
mas me faltam tintas, telas e talento
tenho contas que não se pagam
e feridas que não se fecham

tenho vontades que não acontecem

não me vejo nem homem
nem menino
mas teimo em continuar vivendo

preferia encontrar no pessimismo
a sorte de uma surpresa

viver é atirar-se sem estar preparado

sexta-feira, abril 21, 2006

Visita

- A felicidade da gente é ver que os filhos estão felizes.
- Ah, eu acho isso perigoso. Não é certo só encontrar a felicidade em algo que está fora de vocês, algo que vocês não controlam. Vocês tem que ter os próprios planos, os próprios sonhos.
- A gente queria colocar vocês pra dentro da barriga da mãe de novo.
- Os três desse tamanho não vai dar certo, pai.
- É. Tá louco?! Agora que eu emagreci tu quer estragar minha barriga?

quinta-feira, abril 20, 2006

A maior sacanagem da vida é que quanto mais você aprende sobre ela, mais você se depara com o grande mistério.
É mais ou menos assim... quando criança e as coisas saem errado, você xinga seus pais, seu amigo, o fabricante do video-game. É então que você percebe que nem tudo está ao seu controle. Aliás, seus pais morrerão um dia e você também. As catequistas adoram a oportunidade.
Aos quatorze anos você tem Deus pra xingar.
Aos dezesseis, a menina que não quis namorar com você é a culpada por toda a desgraça da sua vida.
É bem provável que antes dos vinte anos, e essa é a mais cruel das fases que conheço até agora, se você for persistente em tentar entender os mecanismos da vida (leia-se: se você ainda não se tornou um medíocre acomodado), você ouça falar do existencialismo. Logo se chega à Sartre, que, associado a Nietzsche, pode causar danos irreparáveis.
Não é simplesmente por estar vivendo isso que digo que é a mais terrível das fases. É porque não sobra nada para você culpar, senão você. Chega-se a um ponto em que você olha o problema e simplesmente tem preguiça de entender. A vida não se coloca mais como um desafio, mas como um peso.
E Nietzsche, aquele cretino! Ele não matou Deus... ele eliminou foi o conforto que advém daquilo que não se consegue explicar.
E eu queria ter um sonho que durasse.


(okay, okay... vou voltar a estudar filosofia)


ah, sim... nunca valeu a pena curtir a fossa.
um coisa é estar nela
outra é se rolar na lama

quarta-feira, abril 19, 2006

Diálogos urbanos IV

Um: Me consegue 10 centavos?
Dois: VAI TRABALHAR!
Três: Meu Deus, que grossa!
Um: Me arranja um serviço, então!

domingo, abril 16, 2006

Diário de Bordo

DIA 1

15 anos depois, entrei novamente em um avião. Destino: São Paulo.
Vôo noturno, céu límpido, a vista maravilhosa da ilhota iluminada.
Riso misto de tensão e felicidade.
Sensação de vida. Universo de possibilidades.
Descer na selva, atravessar passarelas.
Lixo no chão e churrasquinho na calçada.

***

DIA 2

Acordo cedo, ando de metrô pela primeira vez e desço na famosa Paulista.
Conheço a faculdade do meu irmão
acompanho a aula de Prática de Música ao som de "Coisa n° 4".
Depois, MASP.
Matisse, Debret, Van Gogh, Picasso, Cézanne, Monet, Renoir, Botticelli, Rembrandt.
De noite, busão para Minas.

***

DIA 3

3h30' da madrugada. Desembarco em Campo Belo
Que loucura isso de ir parar numa cidade totalmente desconhecida
Ando até a praça do centro e espero amanhecer.
Curioso como a velhinha simplesmente abaixou as calças e mijou.
E a mulher que às 4h andava de um lado pr'outro?
Conheço o Rafa, finalmente.
A Nay e a Deb.
Festinha open bar.
Churrasco na roça.

***

DIA 4

Passeio no campo, etc
"Dô conta não", etc.
Jogo de tabuleiro abortado
Piscina gelada
Almoço com bacalhau
Busão pra Sampa.
Nesse ponto detalhes se fazem necessário: eu estava me sentindo tão bem, tão livre, com o pensamento tão fluido, e ao mesmo com pena por ter que ir embora cedo.
Olhei para fora, aquele céu verde, o sol esmorecendo alaranjado ao fim da tarde, o campo brilhando verde. A vida lá fora tão insistentemente continuando pra me provocar. Eu nem sei se ia contrariado, mas sei que chorei.
etc
de noite, eu e meu irmão perambulando acabamos num bar de jazz ao vivo.

***

DIA 5
Planos de visitar a Pinacoteca e a Estação da Luz cancelados.
O teatro foi sacrificado para instalar a internet e decidir o que fazer à noite.
Arrastei meu irmão para uma balada anos 80 no sucessor do Atari Club, o Kat Pub.
Muita gente massa e estilosa o suficiente para assustar meu irmão. rs
Na volta, muita risada no metrô. Incluindo o clone do Seu Madruga e as câmera.
Fiascos.

***

DIA 6
Após uma hora e meia de sono, aquele banho, aquele pastel e aquele caldo-de-cana da feira de Domingo.
Avião de volta. A realidade chamando, para a minha tristeza.
Eu, que não sou corajoso, não consigo largar essa vida e sair por aí levado pelo vento.
Queria ter dinheiro o bastante para não precisar de dinheiro.
Para não precisar ler, senão o que eu quissesse.
Para não precisar trabalhar, senão pra me manter vivo.

sábado, abril 08, 2006

Se acabar o fósforo

Eu vou escrever um artigo chamado "Como fazer fogo usando uma lâmpada incandescente e uma das suas camisetas preferidas".
Inacreditáveis as coisas das quais o ser-humano é capaz.

quarta-feira, abril 05, 2006

Bolha

Precisou apenas uma mordida na maçã para que eles se vissem com "as vergonhas de fora". E desde as folhas de parreira até então pouca coisa mudou: o Homem passou a inventar uma série de coisas que permitissem nos esconder uns dos outro, nos tornar auto-suficientes e intocáveis.
As conversas se transformaram em cartas, em telefonemas, em emails, em scraps. Bem, chegamos ao extremo com os cartões eletrônicos, os caixas eletrônicos, as secretárias eletrônicas, e até os vibradores - as bonecas infláveis pelo menos não são eletrônicas.
Recentemente, vieram os óculos de sol, nos privando do olho no olho. Há quem diga que até mesmo os condicionadores de ar nos carros surgiram para que pudéssemos viver apartados do calor humano da cidade.
Seguindo essa lógica, a invenção mais moderna foi o MP3 Player. Um aparelho bem interessante, é verdade. No entanto, hoje eu percebi algo estranho, quando dois seres - não eletrônicos - se cruzaram e se miraram.
Nos olhos dela havia uma indiferença extraterrena. E depois de tantos anos tocando antena com as outras formigas, aquela era a primeira vez que ele sentia uma... uma "negligência" tão grande, esta seria a palavra. Uma indiferença tão grande entre dois iguais, como se os rumos humanos individuais não fossem o próprio rumo da espécie, resultante de um complexo de forças.
E no seu trajeto viu ainda tantos outros com o aparelhinho...
Naquela noite ele teve um pesadelo: andava num mundo globalizado, onde a cultura de massa se encarregava de inventar tecnologias que imediatamente se transformavam em necessidades. Com exceção dele, todas as pessoas do mundo tinham fiozinhos brancos descendo dos ouvidos, embalavam levemente suas cabeças, moviam os lábios esboçando palavras ritmadas e negavam a condição humana uns dos outros.
- Graças ao Mercado! - disse ele quando acordou e se viu sentado ofegante em sua cama, e continuou - Ainda bem que esse troço custa mais do que vale e poucos podem comprar.

****

"And I'm thinking what a mess we're in
Hard to know where to begin
If I could slip the sickly ties that earthly man has made
And now every mother, can choose the colour
Of her child
That's not nature's way
Well that's what they said yesterday
There's nothing left to do but pray
I think it's time I found a new religion
Waoh - it's so insane
To synthesize another strain
There's something in these
Futures that we have to be told.
"
(Jamiroquai - Virtual Insanity)

contabilize

É preciso estar extremamente bêbado
para descobrir quem você ama,
e quem é realmente importante no seu cotidiano.
na sua experiência de vida.

Eu bebi mais, muito mais do que devia,
e descobri uma serenidade que eu nem sabia que existia em mim,
que me permitiu expressar exatamente o que eu sentia,
num tom de voz tão calmo
que nem eu mesmo sabia que possuía.

Eu disse tudo. Toda a parte que me incumbia.
E não se pode controlar tudo, é verdade...
A vida é menos do que se espera...

Muito menos quando vista aqui do chão do meu quarto

mais uma derrota

domingo, abril 02, 2006

quem espera sempre espera
e, cada vez, acredito menos